29.4.10

Entretanto Assim

Um dia não sei se te saberei os olhos,
o cheiro a que cheiras e o brilho dum sorriso,
a forma como os cabelos soltos ao vento e o vestido que te faz parecer pairar,
os grãos de areia nos teus pés e a pele que o Sol queimará lentamente
um dia eu não mais no teu segundo pensamento, no terceiro
quem sabe em nenhum, senão num armário empoeirado de memórias que se deturpam com o passar dos anos e do amontoar de coisas que foste vivendo,
sem mais reconheceres o som da minha voz ou a que cheiro, a forma como rio e o que me faz sorrir,
o cambalear matinal a caminho de lado nenhum para voltar de seguida para o único lugar onde se pertence
nem que seja
naquele entretanto
deturpamos esta ideia de que a vida são entretantos,
de que sorrisos são folhas de árvores, olhares fugazes luzes que passam por nós e rapidamente se extinguem,
vozes são assobios de vento que passa e toques são espuma do mar na pele,
esquecemo-nos entre o acordar e o deitar a cabeça na almofada destas coisas que nos fazem,
que melhor que fazer, nos distinguem
e se um dia não te souber mais o que dizer não existirás mais para mim,
como talvez nem existas se escrevo sem que saibam de mim ao vento, à espuma do mar e ao Sol que me beija o entretanto a que chamo pele,
porque talvez nunca me tenha num entretanto cruzado contigo e portanto nem existas num lugar que não seja esse mesmo,
um entretanto

vamos hoje em 200 meus,
obrigado

26.4.10

"Sempre"

Existem dias que acordo ou que no espaço que vai do acordar até ao momento em que me ocorre,
que naquele momento por escolha que não minha poderia ser,
quiçá,
o último
no pensamento que me envolve não sei o que deixaria,
para além do vácuo das poucas pessoas que me são próximas,
das outras que levariam tempos infinitos a perceber que algo não estaria bem
às outras imensas que ignorariam tempos infinitos que tais que a minha existência bem,
não a era mais
se me incomoda a ideia?
nem um pouco,
ainda que me tenha assolado hoje por algum motivo que talvez se prendesse com a menor (pre)disposição
para sorrisóneas amenas,
o facto de a qualquer momento como sempre esperei, ela chegar assim sem pré-aviso, sem simpatias e de beijo leve,
deixando apenas a ideia do que deixámos por dizer e fazer,
que ligações deviam ter sido cimentadas,
em que lugar teria os olhos postos senão naquele pôr-do-Sol de sempre que será assim para sempre meu
para sempre
eu

21.4.10

Cabranito.pt

É tentador recorrermos ao nosso espírito crítico,
de cada vez que algo previsivelmente falha ou que nos falham,
de cada vez que uma desilusão teria supostamente de ter lugar quando já pacientemente a aguardamos,
de cada vez que nos recordamos que já vivemos tanto e tão intensamente que certas histórias ainda que pintadas da mesma côr,
relatam precisamente as mesmas acções, o mesmo enredo e inevitavelmente o mesmo final
reverteremos portanto nós mesmos à condição de menos bom?
a uma condição confortável que nos permita ser o veículo que usa e abusa do espírito alheio?
aquele que sem consideração usa corpos e almas para seu delírio e puro divertimento fechando ao final da noite os olhos sem pinga de remorso porque tem a desculpa,
o Mundo é feito assim
e é, convenhamos
dos jogos que pensam jogar comigo comigo a ver, das coisas que não se dizem porque não dá jeito mas estão tatuadas nos olhares e no rosto ou em pensamentos distantes, dos desculpa lá mas agora não dá jeito
pessoas,
minhas caras e estimadas pessoas,
não é por mero acaso que no geral vos desprezo sem que me ache melhor ou pior,
é porque no geral a minha vida é bem melhor sem vos ter por perto,
porque retiram mais do que me acrescentam, roubam mais do que trazem e fazem por destruir mais do que constroem
e juro que reconheço e valorizo o esforço,
e o meu caminho é em metade tão bom quanto a outra metade que vossa a palmilhar
mas não palmilham e portanto nem por isso eu mais merecedor, mais preocupado, mais por vezes só talvez, mas mais eu
e sim, senhor do meu senhor nariz, da senhora vida que é minha e dos lugares a que pertenço não obstante de vocês e garanto,
todas as noites durmo na paz e tranquilidade que construí para mim
sem que me pesem por momentos os pecados que não são meus
ainda que por mim tenham passado
sem que ao fechar os olhos me passe por momentos a ideia de me lembrar que um dia me tentaram fazer assim,
menos eu,
pessoas

15.4.10

"Loving Angels Instead?"

Há esta que dizem,
concordo,
a música do século que por mil vezes passou pelas minhas cordas vocais e me abriu o brilho dos olhos,
que em dias menos solarengos e outros que solarengos tais me foram âncora à alma,
entre incontáveis outras que não são para a conversa agora chamadas - cantadas - nem importa o que dirá uma canção, o que fez quem a canta, a nossa opinião dessa figura, do estilo da mesma
importam os lugares onde ela nos leva, as pessoas com quem a cantámos, os abraços, beijos, os sorrisos parvamente largos e lá está o tal,
aquele
brilho nos olhos
encontrem-no onde queiram,
na pessoa que mais gostam, na vossa música, no céu, no mar, numa onda, numa conversa, num abraço e num beijo, encontrem-no num grão de areia, no vosso coração, na profundeza ou superfície da vossa alma,
nos dias mais escuros e ensolarados, ao raiar do dia ou ao final de uma noite mas sem esquecer,
estamos vivos
e viver é agora

"And through it all,
I'm loving angels instead"