28.10.10

A Ser (ainda aqui)

Tempo,
somos apenas tempo,
o dispêndio quotidiano, gasto em absurdos mil
o restante, passado em desejos e anseios
por fim o essencial, uma ténue amostra de todo o tempo que nos sobra,
passado em puro deleite,
em lábios alheios que são por tempo nossos, em pele alheia que é por dedos nossa,
a casa a que ansiamos regressar e ficar por mais tempo, mais profunda e confortavelmente
mas tempo somos,
gastando o meu em nadas e pedaços de nadas,
em mãos-cheias de nada, palavras ocas, salas silenciosas e noites de batalha minha e minha apenas com os lençóis
recordava-me no outro dia de demónios,
aqueles que carregamos connosco vida fora, existência, imprudentes demónios
as coisas que nos devoram a alma, os Passados que não se deitam fora,
um homem pode aprender muito com a vida e muito com o Passado porém, se se agarrar em demasia a qualquer uma de ambas corre o risco de perder o que tem passando a existir num paralelo, numa dimensão que não a dele, onde não ele
aos demónios e ao tempo,
a nós homens, vocês mulheres,
que se parem os relógios
se deixem de lado coisas simples como o acordar, ir trabalhar, ir às compras e fazer o jantar,
que se tire ocasionalmente um dia ou não tão ocasionalmente dois ou três,
para se perderem e descobrirem,
onde quer que queiram e da forma que queiram
quem são e de que são feitos,
antes que o tempo, esse ignóbil incontornável
das duas uma vos faça sem dó nem piedade esquecer
ou ajustando contas vos traga à crua realidade que um dia,
bem nesse dia,
não terão mais tempo para ser